quinta-feira, 5 de julho de 2018

3 anos de mudança, 2 anos de IPO


Pois bem, pouco passava das 00h e fui assoberbado por memórias. Memórias boas, memórias tristes, pelo que significaram, e outras memórias que marcaram voltas de muitos graus na minha vida. Se a vida dá muitas voltas, pois que parece que dia 5 de Julho parece ser a data das minhas mais significativas mudanças.
Há dois momentos marcantes nesta data na minha vida:
- 5 de Julho de 2015 - Larguei a minha vida em Évora e o serviço da Medicina 1, e consequentemente cheguei a Lisboa para ingressar no Hospital Fernando da Fonseca;
- 5 de Julho de 2016 – Primeiro dia no serviço de Pediatria do IPO de Lisboa.

Primeiramente, faz hoje 3 anos que resolvi “abandonar” a vida que tinha, que despertei para a procura de um sonho e com todas as consequências e sofrimento que também me traria. Deixei Évora, deixei aquela que foi a minha cidade e a minha casa por 9 anos, onde fui e serei sempre muito feliz, para ir para a Capital. Não por desejar e sonhar com Lisboa mas sim porque as oportunidades e sonhos a concretizar só ali seriam possíveis. Fi-lo porque a vida estava parada e o sofrimento de uma solidão anunciada não traziam nada de bom. Haviam sonhos estagnados no “semáforo da vida”, à espera de serem vividos.
E acordei, respirei fundo, calculei, deixei fluir a energia necessária e resolvi tomar decisões. Vim e deixei para trás uma vida já construída e onde fui muito feliz. Mas agora já não fazia sentido. Podia ter crescido ainda mais naquele “vaso” que foi a Medicina 1 mas todas as plantas postas em vaso, precisam de ser replantadas e, eu precisava de ser posto em solo fértil para continuar a crescer. O mais importante é que não vim sozinho, trouxe comigo as memórias, as pessoas especiais no coração e na mente e, sempre que volto, sinto o mesmo carinho e o mesmo amor que tinha quando ali estava. Na passada quarta-feira após meses de distância reencontrei-vos e bolas, parece que nunca saí daí! Foi tão bom rever-vos! A força dos vossos abraços, os vossos beijinhos trás consigo um terramoto de emoções fortes e o desejo de ter poderes e conseguir, por tudo, voltar atrás no tempo, um dia que fosse, e ter a honra de trabalhar novamente ao vosso lado!



Há sítios que serão sempre a nossa casa, há camisolas que vestimos e defendemos em algum momento da nossa vida e serão sempre especiais para nós. Assim o é a Medicina 1, assim o é o HESE e assim será a cidade de Évora. Posso viver em 10 cidades, poderia ter passado por 15 locais de trabalho mas nunca nada será como o primeiro sítio, por todo esse poder. Todo o jovem que sai de casa e vai “para o mundo”, pode ter uma imensidão de oportunidades mas nunca haverá local como a nossa casa, aquele espaço onde temos “a nossa base”.
Estou a trabalhar hoje onde sempre quis estar, num sonho adormecido e que foi protelado por outras prioridades mas o primeiro local é sempre especial. Tenho saudades vossas minhas amigas e amigos, do quanto me ensinaram e ajudaram, do que fizeram de mim e da honra que era prestar cuidados ao vosso lado! Os melhores exemplos, os melhores conselhos, as maiores festas e parvoíces e todo o carinho que nunca deixou de existir.







Ainda passei um ano em busca do meu sonho e nesse período passei por outro local que me é muito especial. Não pelo local mas sim pelas pessoas que ali conheci e que ainda hoje tenho comigo. No Hospital Fernando da Fonseca muito aprendi, “caí de paraquedas”, assustado na capital, num serviço novo e bem diferente do anterior, onde tanta gente especial ficou para trás. Fui apoiado, ajudado, ensinado e encontrei pessoas realmente especiais e que ainda hoje partilham a minha vida!




Mas a vinda para a capital era para concretizar o sonho e ainda estava à espera. Lutei, procurei, e encontrei. Deram-me a mão e chamaram-se do cimo do 7º piso para poder subir para o sonho. Todo um mundo de oportunidade, de objectivos a atingir e de vivências para ter. No dia 5 de Julho de 2016 comecei a exercer funções naquele que, para mim, é o mais especial dos serviços: Pediatria do IPO de Lisboa. Tudo mudou nesse dia, o que era certo deixou de ser, o medo sempre existiu pela responsabilidade que tinha, não só com aquelas crianças e colegas, mas principalmente comigo mesmo, por ter “desistido” de tanto por aquela oportunidade!
E passaram 2 anos. Faz exactamente 2 anos que esta pequena criança de 30 anos entrou por aquelas portas de vidro e, quando estas se fecharam atrás de mim, soube que o desafio era para agarrar e viver. E hoje por muitas dificuldades físicas e psicológicas que possam ter surgido, não duvido que foi o melhor caminho. Que a vida seguiu o que tinha de seguir e estou onde sei que consigo ser o melhor de mim! Sempre dei o melhor por onde passei e trabalhei mas aqui sinto que estou naquele que é o meu habitat natural! Ou não seja eu uma eterna criança.



Cada dia exige algo de novo e há dias que só apetece sair e vir para casa. Fugir. Mas vale a pena, cada dia vale a pena e dá sentido ao que fazemos. Dá sentido ao que somos.
A vida nem sempre facilitou, levou-me muitas pessoas especiais (algumas sem volta), abanou-me a estrutura de vida, trocou-me planos e objetivos e trouxe à carga sonhos e desejos latentes. Mas aprendi que a vida leva mas também trás! Há sonhos que não podemos deixar de viver! Aqui, onde estou actualmente (e espero permanecer muitos anos) aprendemos, infelizmente, que a vida nem sempre nos permite concretizar todos os sonhos, por isso, se podemos lutar por eles, porque não o devemos fazer?!
Custa largar os “portos seguros”, aquilo que já conquistámos? Custa, mas por vezes para subir dois degraus, temos de descer um. Não sei se subi, o que desci, mas sei que cheguei. Cheguei ao sonho e estou a vivê-lo!
Aprendi que não existem sonhos perfeitos. Há lados negativos e difíceis nos sonhos mas aqui nesta nuvem onde vivo o meu sonho, no 7º piso, os sorrisos, as brincadeiras, os desenhos, os cheiros, os abraços e até os momentos maus, as lágrimas, as derrotas me fazem acreditar que estou onde tenho de estar! Onde sou feliz e onde sou capaz de dar o melhor para fazer feliz quem mais precisa!
Crianças e famílias que conheci, que conheço e que conhecerei, cujo destino vos trouxe ou, infelizmente trará, até aquele local tão mal visto e nada desejado, posso prometer-vos que darei o meu melhor. Não posso prometer curas, truques de magia, ou que não custe, mas posso prometer que farei o meu melhor, mesmo em dias maus. Só passaram dois anos mas ficarei o mais que conseguir, ao vosso lado e dos meus colegas (a quem quero muito agradecer por tudo e por viverem ao meu lado todo este percurso)! Muitos de vós ainda não percebem nem sabem ler mas, espero que um dia possam ler e isto e acreditem:
“Os sonhos, mesmo que temporariamente latentes, não precisam morrer e ser esquecidos! Podem e devem ser vividos! Se agora não os podem concretizar, não significa que não possam ser feitos e concretizados. Os sonhos fazem mexer o corpo e dão energia à alma! Uma criança e jovem sem sonhos e sem sorrisos e motivação é um corpo vazio. Recarreguem energia, apoiem-se nas famílias, nos amigos e naqueles que também passam a ser vossos amigos: nós.”
5 de Julho, não sei porque foste sempre uma data especial mas obrigado pelos feitos, pelas conquistas e por seres a data onde a coragem de mudar e lutar foram mais fortes que a preguiça e o medo. Que os próximos anos tragam mais coisas boas, sorrisos, força e sempre que possível, vitórias para mim, para todos aqueles que sempre me acompanharam e para todos os pequenos e grandes heróis que, no dia-a-dia, me metem um sorriso na cara e uma alma cheia.

A todos vocês, o meu muito obrigado!